quarta-feira, 9 de maio de 2012

Vamos Discutir?: " O falsificador"


Leiam aqui a íntegra do texto de Leonardo Martinelli sobre André Rieu, publicado na edição de maio da Revista CONCERTO.


 
 
 
 
 
 
"O falsificador"

Com a chegada de André Rieu ao Brasil, o autoproclamado popstar da música clássica, levanta-se o debate: afinal, por que não vale a pena escutá-lo?

Por Leonardo Martinelli

No final deste mês se inicia no Ginásio do Ibirapuera, na capital paulista, a série de shows que André Rieu e sua companhia farão no país. Originalmente seriam apenas três apresentações, mas a enorme procura ampliou o número para 18, que se estenderão até o início de julho, com ingressos que podem chegar a R$ 400. A mesma dinâmica se observa em outros países, inclusive na Europa e nos Estados Unidos.

Autoproclamado popstar da música clássica, André Rieu é o protagonista de um dos maiores fenômenos da indústria fonográfica da atualidade. Para isso, ele aposta numa fórmula que vem aprimorando desde o início da década de 1990. Tudo começa com um espetáculo de forte apelo visual, no qual os principais estereótipos (reais ou imaginados) que orbitam no universo da música clássica são acentuados a ponto da total descaracterização. Cenários que remetem ao mundo mágico dos desenhos animados, músicos vestindo fraques de cortes extravagantes e musicistas paramentadas como bonecas de porcelana são elementos primordiais de um cenário dantesco.

Em segundo lugar, vem a música. Clássica ou popular, ela é invariavelmente travestida em arranjos paquidérmicos que atuam como um rolo compressor que esmaga aquilo que diferentes linguagens e estilos têm de melhor. Tudo isso é amalgamado pela própria figura de André Rieu, o anfitrião, com uma lábia simplória e um sorriso charlatanesco que arranca suspiros de sua audiência.
Rieu é apenas mais uma das crias daquilo que se costuma chamar de indústria cultural. Pensado como um grande negócio, seus espetáculos não apenas usurpam o patrimônio musical da humanidade. Pior, eles são artisticamente violentados com o propósito de ser mais “palatáveis”. E, pior ainda, dessa forma difunde-se uma ideia falsificada do que são a ópera e a música de concerto.

Há quem alegue que Rieu realiza importante contribuição ao popularizar a música clássica e que seria uma porta de entrada para este mundo. Não é verdade. Primeiro, porque o máximo que ele faz é se autopopularizar por meio da difusão do culto a sua figura (incluindo aí os mais diferentes tipos de souvenires). Sua estratégia visa a estabelecer um circuito de consumo fechado, no qual a compra de um DVD André Rieu conduz a compra de outro DVD André Rieu, e agora, para nós, a um dos caros ingressos de seus show. Nada vindo de fora é tolerado.

Em segundo lugar, é um argumento ingênuo (na melhor das hipóteses) achar que esses produtos atuam como introdução ao universo da arte. Fãs de Harry Poter não serão leitores de Shakespeare. Com o fim da série comercial de livros, ele migraram para outra, por exemplo, os volumes da “saga” Crepúsculo, e assim sucessivamente. Na prática, os atuais fãs de Rieu são as viúvas de Ray Coniff – seu famoso “arranjo” do Bolero de Ravel jamais conduziu seus fãs para a escuta da obra original.

Não se exclui a possibilidade de uma ou outra pessoa eventualmente cultivar um ambiente verdadeiramente artístico a partir do contato com esses enlatados culturais. Mas, comparado ao rastro de mau gosto e desinformação que eles deixam, é um preço alto demais a ser pago. Literalmente, pois é possível fazer coisas muito mais interessantes com a colossal quantidade de dinheiro que essas celebridades movimentam.

A propósito das desventuras literárias do famoso bruxinho, evoco aqui o termo que o crítico literário Harold Bloom usou para definir o sucesso do personagem: “desesperante”. Bloom argumenta que uma criança ou um adolescente tem plenas condições de começar sua vida de leitor com obras do mais alto valor artístico. Com a música não tem porque ser diferente. Que mal há em ouvir um Mozart, um Vivaldi ou mesmo um Johann Strauss sem a maquiagem grosseira promovida por Rieu? E olhe que não faltam no mercado produtos artisticamente honestos que propõem abordagens diferenciadas e acessíveis no amplo sentido do termo.
Apesar de desesperante, o próprio Bloom nos lembra que, ao longo da história da literatura, não faltam exemplos de grandes sucessos comerciais que logo passaram para o esquecimento. É a esperança que resta.

5 comentários:

  1. Olá Senhor Leonardo, bom dia
    Tristemente acabei de ler sua matéria intitulada “O falsificador”, cujo tema é a chegada da turnê do maestro André Rieu ao Brasil e inicio “invertendo” a primeira questão: afinal, por que VALE a pena escutá-lo?
    Com relação ao preço dos ingressos sua matéria já se inicia com descrédito: os ingressos para as apresentações podem chegar a R$2.500,00, basta acessar o site www.ingressorapido.com.br. Qualquer pessoa menos esclarecida poderá constatar essa afirmação.
    O senhor acerta quando afirma que a mesma dinâmica se observa em outros países, inclusive na Europa e nos Estados Unidos, onde a cultura musical é muito maior e, infelizmente, não pode existir comparação com a do nosso querido Brasil.
    Acerta, novamente, ao citar que André Rieu é o protagonista de um dos maiores fenômenos da indústria fonográfica da atualidade, com forte apelo visual, mas erra ao afirmar que se chega ao ponto da total descaracterização. Oras, se o próprio Ravel, ao assistir à sua obra em Paris, desclassificou o regente (não me lembro qual) pelo tempo imposto à mesma, quantos regentes a apresentam corretamente? Será que a apresentação do famoso Bolero, pela Sinfônica de Israel, sob a batuta de Daniel Barenboim, está correta? Com solo inclusive de Fagote? Não creio que muitas obras hoje em dia sejam executadas na sua totalidade como deveriam ser e se seriam aprovadas por seus compositores. André Rieu, com seus cenários que remetem ao mundo mágico dos desenhos animados, músicos vestindo fraques de cortes extravagantes e musicistas paramentadas como bonecas de porcelana, caiu sim no gosto popular dos mais avançados centros de cultura musical no mundo. Se não são apresentações a rigor, como o senhor acha que deveriam ser, elas aproximaram mais o público alienado a essa cultura da música clássica-popular, e aqui me incluo. Seu público quer participar, quer ser feliz, quer cantar e dançar ao som das valsas de Strauss sem se importar com um mínimo desvio do tempo do compasso ou se houve a troca acidental de um SiB pelo C, embora seus músicos, sem exceção, possuam sólida formação musical. O próprio André Rieu, desde muito cedo se familiariza com a arte da música. É um grande negócio sim, porém é uma apresentação inesquecível, assim como o Cirque du Soleil. Note-se que a venda dos ingressos para suas três primeiras apresentações aqui no Brasil, iniciaram-se em 17 de dezembro de 2011, e esgotaram-se no mesmo dia, quase seis meses antes da primeira apresentação. Ora, o senhor conhece algum outro acontecimento cultural aqui no Brasil que seria capaz de bater tal feito?
    Usurpar o patrimônio musical? Nas apresentações de Rieu, isso não existe, pois através delas, seus CDs e DVDs, seu público toma conhecimento da existência de obras maravilhosas, e passa a admirá-las e procurar ainda mais por elas.
    Senhor Leonardo, sinto pela suas colocações, mas mostram o lado de uma pessoa que sempre fará a mesma por toda a vida, visitará sempre os mesmos lugares, ouvirá sempre as mesmas músicas, não se importando se, além do que tem de ser feito, existe ou não coisas mais belas para se apreciar. Ora isso é exatamente o que pensam os “funkeiros” e apreciadores do “rap” e Mr. Catra. Ora, tenha paciência…

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  2. Senhor Leonardo, é uma pena que um homem com uma vasta educação como o Sr. , ainda por cima Educador da História da música, se preste a dizer essas atrocidades contra um Músico de reconhecimento mundial como André Rieu! É óbvio que as obras apresentadas por ele são adaptações dos grandes compositores clássicos, mas que de alguma forma estimulam seus ouvintes , e como o Sr. Diz Idólotras, a apreciar a música erudita em sua integridade, esse é o meu caso, pois foi a partir da obra de Rieu que passei a apreciar Strauss, Mozart, Tchaikovsky... inclusive, atualmente possuo mais CD´s dos grandes clássicos do que do próprio André ,mas não deixo de compra-los a cada lançamento. É bem verdade que astros como André Rieu podem Cair no esquecimento, mas isso depende diretamente de seu legado para a humanidade, o que, no caso do André, é muito pouco provável de acontecer, pois ele a cada dia marca a vida de milhares de pessoas ao redor do mundo proporcionando alegria. No entanto, pessoas como o Sr., que buscam nem que seja destacar-se momentaneamente criticando o sucesso daqueles que realmente contribuem para a difusão da música clássica no planeta, nem isso conseguem, e até por esse motivo, são muito rapidamente esquecidas. Pior ainda, pessoas como o Senhor só contribuem para difundir uma ideia falsificada e preconceituosa de que os músicos eruditos são pessoas mal educadas, temperamentais e invejosas. André Rieu vem conseguindo brilhantemente desmentir essas convicções generalizadas e arcaicas, mostrando que a música clássica pode ser feita com alegria e pode sim cair no gosto das massas como no passado.

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  3. "Na prática, os atuais fãs de Rieu são as viúvas de Ray Coniff – seu famoso “arranjo” do Bolero de Ravel jamais conduziu seus fãs para a escuta da obra original."
    Nada a ver seu comentário.....Ray Conniff divulgou a musica do mundo independente do genero. Não se colocava como um "popularizador" de musica clássica, mas levou a cultura musical de diferentes paises para o resto do mundo conhecer. E o fez de maneira magistral ao seu estilo.

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    1. Gente prá que se estressar com as palavras desse Sr. Leonardo? Ele está apenas querendo que os holofotes brilhem por parcos minutos sobre a sua cabeça! Está tentando ter o seu momento de fama difamando um grande artista! É assim que agem os invejosos! Ora faça-me o favor!

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  4. Senhor Leonardo Martinelli, pelo visto o senhor se baseia apenas nos DVDs e no espetáculo do Ibirapuera em São Paulo. Eu tive o privilégio de assistir um espetáculo de André Rieu no Stade de France (Estádio de Futebol da França), que ficou lotado. O serviço sonoro estava perfeito! Por exemplo, na obra “Nessun Dorma”, as pancadas da caixa baixa “bombo”, quando executadas, eram bem vibrantes ao ponto de estremecer o piso! A iluminação obedecia aos movimentos da musica! Isso se chama a evolução da arte clássica! Anna NETREBKO, a melhor soprano do mundo, já começa a cantar mediante uma maior comunicação com o público, vasta ver esse vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=bFDFU7rxs88
    De forma que o senhor L. MARTINELLI precisa evoluir na arte cênico-musical que andam juntas e não podem se separar!

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